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Brasil educação e vida espiritual

“Meu povo perece por falta de conhecimento” Oseias 4, 6

Neste texto, quero te convencer de que a tua formação e desenvolvimento pessoal influenciam na tua vida espiritual e religiosa. Mas primeiro vou dar um pequeno contexto sobre a situação da educação no Brasil e introduzir alguns conceitos. Fique até o final para entender as consequências disso.

Não existe educação no Brasil

Vamos começar com um pouco de estatística. Existe uma prova internacional chamada PISA, que faz questão de nos relembrar, a cada quatro anos, que os estudantes brasileiros não conseguem realizar contas básicas e também não sabem interpretar textos básicos. E não adianta acreditar que, se seu filho está em uma escola particular ele está fora dessa estatística, o baixo desempenho independe disso, não há por onde fugir.

Sobre a leitura, o brasileiro lê em média dois livros completos por ano. Para quem entende de estatística sabe que, ao colocar essa informação em um gráfico de distribuição normal, vai mostrar que metade lê menos do que isso. E para piorar, essa pesquisa considera qualquer tipo de livro. Então faça o teste você mesmo: abra a lista de livros mais vendidos da Amazon,o que vai encontrar são livros progressistas, livros de conteúdo explícito, se é que me entende. Isso acontece porque mulheres conseguem consumir pornografia pela imaginação e idealização, diferentemente dos homens que são mais visuais. Agora, puxe as estatísticas de aumento do consumo de pornografia e verá que quem está ajudando a aumentar a quantidade de livros lidos são mulheres viciadas em conteúdo adulto. E por fim, chegamos à conclusão de que o brasileiro não lê e, quando lê, é bem provável que seja um livro que o prejudique ao invés de ajudar.

Analfabetismo no Brasil

As porcentagens vêm do INAF de 2018, pois aparentemente são os dados mais recentes. Se somar as porcentagens, não dá 100% porque eles arredondaram:

  • Analfabeto(8%): Não consegue realizar tarefas simples, ler e escrever, mas consegue decorar um número de telefone, por exemplo.

  • Rudimentar(22%): Consegue localizar informações explícitas em um texto pequeno, desde que essas informações sejam familiares. Exemplo: consegue pegar um jornal e ler uma notícia sobre greve de ônibus, pois isso faz parte do seu cotidiano.

  • Elementar(34%): Consegue selecionar informações em textos médios e fazer pequenas inferências com algumas informações. Consegue trabalhar com números até a casa dos milhares, mas não consegue fazer contas de proporção, como a regra de três.

  • Intermediário(25%): Consegue localizar informações literais em textos diversos, realizando ainda pequenas inferências. Ou seja, essa pessoa ainda não consegue tirar grandes conclusões ou extrair informações mais sutis de um texto. Só aqui a pessoa é capaz de fazer um resumo de uma notícia, fazer uma relação de proporção, entender pontuações como, por exemplo, um ponto de interrogação e, por último, e peço que lembre disso no final do texto, é aqui que uma pessoa começa a conseguir correlacionar uma situação, emoção, etc., que acontece no texto com sua própria vida.

  • Proficiente(12%): Aqui as pessoas são capazes de elaborar textos com maior complexidade com base em elementos de um contexto. Também são capazes de opinar sobre um texto ou autor. Não estou falando de uma grande crítica, mas de uma opinião do tipo: “Que texto profundo, gostei, a linguagem é um pouco confusa, mas foi proveitoso”. Só aqui uma pessoa é capaz de fazer esse nível de análise. Ou seja, para essa pesquisa, ser proficiente é ter um letramento básico. E, para finalizar com chave de ouro, somente aqui a pessoa é capaz de diferenciar um fato de uma opinião.

Rafael Falcon, em sua aula “O dever de autoeducar-se”, chega à seguinte conclusão: “não é que a educação no Brasil seja fraca, é que não há educação no Brasil”.

Se quiser uma aula sobre esse ponto assista: O PODER DA LÍNGUA - O Resgate da Linguagem

Níveis da linguagem

Primeiro nível de linguagem: é a linguagem que permite a comunicação com outra pessoa, sendo essencialmente funcional. Pessoas que não têm esse nível de linguagem não conseguem se expressar adequadamente, não têm capacidade de colocar para fora o que passa em suas cabeças, e acabam usando gírias sobre gírias. Não possuem vocabulário suficiente em suas mentes para se expressarem. Aqui também se inclui o entendimento de símbolos básicos, como semáforos, placas de perigo, entre outros.

Segundo nível de linguagem: é a linguagem prática, que faz a ponte entre o homem e o mundo, envolvendo a interação com o ambiente externo. Trata-se de saber o que fazer, quais instrumentos/ferramentas usar, entre outros aspectos. Um grande exemplo é aquele homem, possivelmente seu pai ou avô, que é capaz de consertar qualquer coisa. Esse nível não exige uma bagagem de leitura extensa, você pode ser o melhor pedreiro sem ser engenheiro, o melhor eletricista sem conhecer tudo de física, ou um fazendeiro sem dominar a biologia.

Terceiro nível de linguagem: é o nível imaginativo. Por exemplo, imagine que você está na sala de sua casa e gosta muito desse lugar, no entanto, ao refletir percebe que poderia melhorá-lo, pois é natural do ser humano perceber que algo falta tanto em si mesmo quanto no mundo ao redor. Nesse caso, você percebe que seria ideal ter um sofá maior e, ao realizar essa troca, seria bom também mover a estante da TV um pouco para a direita para que fique “perfeito”. Ter vontade de melhorar é essencial, por exemplo, para o desenvolvimento pessoal. É nesse espaço entre o ideal e o real que ocorre a linguagem imaginativa, proporcionando as ferramentas para que essa imaginação se concretize. Sem isso você fica preso ao mundo como ele é.

É nesse nível de linguagem que entra a literatura, pois ele demanda que você identifique padrões que se repetem na realidade em circunstâncias diferentes, e a leitura é o principal meio pelo qual absorvemos e aprendemos esses padrões. Os livros são a base da linguagem imaginativa, embora filmes, séries e música também possam capturar essa essência, pois todos esses meios culturais derivam da literatura. Dentro da literatura, há duas fontes primordiais: a primeira é a Bíblia, que nos fornece todos os temas e assuntos discutidos ao longo dos séculos, e a segunda são os mitos gregos e romanos, que têm conexão com todos os livros clássicos.

Veja bem, todos os níveis de linguagem são importantes, um não exclui o outro. Para ser uma pessoa completa e capaz você precisa ter um nível decente nas três linguagens, mas é claro que algumas pessoas acabam se destacando em um nível específico. Você até consegue alcançar proficiência no terceiro nível de linguagem sem ser um grande consumidor de literatura, mas usar isso como desculpa para não ler é bastante ingênuo, pois além de ser menos eficiente, você não estará se beneficiando do conhecimento acumulado ao longo dos séculos.

Para quem gostou do desenvolvimento dessa ideia de níveis de linguagem assista: Brasileiro tem orgulho da própria burrice

Importância e licitude da literatura

Bom, espero ter conseguido explicar um pouco da importância de ler, mas talvez você ainda tenha reservas quanto à literatura por causa de sua natureza fantasiosa, fictícia, enfim, por envolver muitas coisas não reais. Será que escrever ou ler esse tipo de coisa é imoral? Para não me estender muito, vou deixar de lado os casos óbvios de leituras indecentes mencionados no início. Cabe também ao leitor, a responsabilidade de ler pelo menos a sinopse dos livros antes de comprar e pelo amor de Deus usar o bom senso.

Ficção/fantasia é mentira/imoral?

Para começar é importante deixar bem claro o que é a mentira e só depois ver se esses tipos de literatura se encaixam nessa categoria. A mentira nada mais é do que a dissociação entre seu intelecto e sua palavra falada. Diferente da falsidade, a mentira é independente da realidade exterior. Por exemplo, se um daltônico olha para o céu e afirma que ele é verde, mesmo que isso seja falso, não é uma mentira, pois essa pessoa daltônica realmente acredita e vê o céu verde e entende dessa forma. Portanto, em seu intelecto, o céu é verde, e ele proferiu uma afirmação de acordo com o que ele entende como verdade.

O que quero demonstrar é que algo não precisa ter realmente acontecido na realidade para que você possa expressá-lo sem o peso do pecado. Outro exemplo seriam as parábolas que Jesus contava, o filho pródigo não precisa ter existido para que a mensagem que Jesus queria passar seja verdadeira. Para que a afirmação tenha esse valor moral negativo, o único requisito é essa dissociação entre intelecto e palavra falada. Afirmar que o céu é azul acreditando que o céu é vermelho é mentira e é pecado, mesmo sendo uma verdade, pois como mencionei a realidade externa não importa nessa análise.

Aprendemos com Tolkien em seu ensaio “On Fairy-Stories” que os contos de fadas são sobre os contos e não sobre as fadas. Assim é a literatura, pouco importa se o filho pródigo existiu ou não. O que importa é a verdade, a mensagem, o significado, toda a carga que essa história nos traz além da casca do menino que retorna à casa de seu pai. As histórias são assim, temos a casca que é o que você lê e temos o significado, o porquê de tudo aquilo, que é você entendendo o que o autor quis explicar e mostrar. Por isso, um livro de ficção científica, fantasia, folclore, etc., não é pecado mesmo sendo falso por não existir.

Impacto na vida espiritual

E por que eu falei tudo isso? O que tem a ver com a vida espiritual? Bom, tem tudo a ver. Vamos pegar como exemplo a leitura da Sagrada Escritura, a Bíblia. Lembra dos níveis de alfabetização e que somente no nível intermediário se consegue correlacionar uma situação, emoção, etc., que acontece no texto com a própria vida? Então, uma pessoa abaixo desse nível não consegue tirar proveito, por exemplo, das parábolas do Evangelho. Se você não consegue entender que você é o filho pródigo quando peca, se arrepende e se reconcilia com o Pai, o que você tirou dessa parábola? Nada, um ensinamento virou apenas uma historinha. A conclusão que posso tirar é que pelo menos 64% da população está incapaz de ler qualquer coisa da Bíblia. Agora, a quantidade de pessoas que conseguem captar essas outras camadas de interpretação é difícil de estimar, mas sendo generoso é BEM provável que seja menos de 10%.

A Bíblia possui camadas de significados que passam despercebidas sem uma boa educação, e pior, não é difícil encontrar pessoas que caem em erro por falta de percepção dessas camadas. Será que é à toa ou mera coincidência/acidental Jesus ter transformado água em vinho, por que não cerveja, ou um suquinho de uva? Será possível fazer alguma correlação entre essa água e vinho com o sangue e água que jorraram do peito de nosso Senhor Jesus? Quem não percebe que não é coincidência e que há correlação perdeu uma linda camada de significado e uma verdade que foi dita de uma maneira implicita.

Não só isso, essa falta de desenvolvimento também atrapalha fora da leitura. Todo cristão reconhece a necessidade de melhorar como pessoa. Para fazer isso, você precisa identificar seu eu atual e qual seria seu eu ideal para Cristo, e tentar buscar e imitar esse ideal. Como é possível esse processo sem o terceiro nível de linguagem? Simplesmente não é. Para se desenvolver nesse processo, você precisa identificar padrões em seu comportamento, identificar padrões em Cristo, e imaginar seu ideal em Cristo. Sem intelecto, não há vida religiosa e espiritual. Os anjos foram testados, os homens estão sendo testados em vida, mas os animais e plantas não, por quê? Porque somente as criaturas racionais são testadas. A confissão dos pecados, a busca pela santidade, etc., tudo isso requer o uso da sua inteligência.

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